A banalização da oração

Ielton Isorro

Estava eu na Fundação Casa, conversando com uns internos, quando começamos a falar sobre oração. E quis saber que experiências os rapazes tinham com o tema. Eles me falaram que sempre ´oravam´ antes das “correria”. Ou seja, antes de um assalto rezavam um “pai nosso” ou falavam com Deus para livrá-los de qualquer incidente naquela ação. Que absurdo! Que deus é esse que foi apresentado àqueles moços? Ou eles de fato mal o conhecem de ouvir falar? Mas não fiquei tão surpreso que fosse assim.. Quando vi na televisão a cena do pessoal do mensalão do DEM, orando fervorosamente, no mais puro estilo pentecostal ou carismático, agradecendo a Deus, pelo êxito daquela falcatrua e pedindo mais, aí sim, fiquei surpreso e não pude deixar de correlacionar um fato a outro.

De um lado delinquentes, de outro “respeitados cristãos evangélicos (crentes?)”. Difícil é saber qual dos dois grupos conhece menos o Deus ao qual queriam se referir. Difícil saber quem tem maior fissura de caráter. Os que andam de Bíblia em baixo do braço, posando de piedosos homens de Deus ou os que, armados, ameaçam cidadãos em troca de um carro e alguns reais? Os criminosos do colarinho branco, que recebem quantias em dinheiro para facilitar algumas operações, mas, darão o dízimo (é claro!), ou os que estão atrás das grades pedindo para Deus fazer a justiça dos homens relevar seus crimes e tirá-los de lá?

Qual grupo é ignorante? Qual grupo é hipócrita? A resposta à essa questão seria mais difícil se não fosse o discurso de Jesus no capitulo 23 do Evangelho segundo escreveu Mateus. Diante desse quadro, no que se transformou a oração? Num instrumento banalizado para manipulação de Deus? Num desabafo de pessoas em momentos de angustia? Em gritos desesperados por um deus que parece surdo?

Entre os ignorantes essas coisas até são admissíveis, pois “Deus não leva em conta o tempo de ignorância” (At 17:31). Já entre nós, os que verdadeiramente cremos, cabe o que está escrito na primeira carta de Pedro 1:13-19. Confira!
"Por isso, cingindo o vosso entendimento, sede sóbrios e esperai inteiramente na graça que vos está sendo trazida na revelação de Jesus Cristo. Como filhos da obediência, não vos amoldeis às paixões que tínheis anteriormente na vossa ignorância; pelo contrário, segundo é santo aquele que vos chamou, tornai-vos santos também vós mesmos em todo o vosso procedimento, porque escrito está: Sede santos, porque eu sou santo. Ora, se invocais como Pai aquele que, sem acepção de pessoas, julga segundo as obras de cada um, portai-vos com temor durante o tempo da vossa peregrinação, sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo,"
Como saber quem são os ignorantes e quem são os hipócritas? Essa questão seria parecida com a de como separar o joio do trigo, mas, outra vez Jesus facilitou o nosso discernimento quando afirmou que é pelos frutos que conheceremos as árvores (Mateus 7:16). Ou seja: De um jovem interno da Fundação Casa podemos esperar qualquer coisa. De homens e mulheres crentes não!

A banalização da oração é um sintoma da banalização de Deus. Essa sociedade prevê, como todas as outras, deuses úteis aos seus propósitos. Um deus a quem possa se determinar o que fazer, um deus que nunca diz “não”. Um tipo de deus que ceda infinitas bênçãos diante de sacrifícios prescritos. Essa expectativa de deus é que faz com que, infelizmente, muitas igrejas divulguem um Jesus bonzinho e pronto a realizar todos os sonhos, como um Aladim da lâmpada mágica, com desejos ilimitados para atender aos seus amos. O Jesus que virou as mesas, e que condenou os hipócritas e interesseiros não é um “produto” aderente ao “mercado” que essas igrejas pretendem conquistar.

O deus da prosperidade e da confissão positiva sim, é aderente e impulsionado por essas doutrinas, que se adéquam às expectativas do povo, torna-se mais aceitável do que o Deus verdadeiro que reclamou, dos que nEle crescem, uma conduta digna do seu caráter. Portanto é mais fácil pregar um deus a quem se diga o que ele deve fazer, do que ensinar a aceitar o Deus verdadeiro que descreve em sua Palavra qual é a conduta dos que o seguem.

Nesse cenário surge uma pseudo-espiritualidade, com muitos matizes do Evangelho verdadeiro, mas sem a essência do mesmo. Multidões são arrastadas pelo discurso fácil e egoísta da auto-realização, estimuladas pela “marketização” de uma nova religião, que a ela atrelou o significado do nome de Jesus, onde poucos verdadeiramente o conhecem e desenvolvem um relacionamento com Ele, fator principal para a verdadeira conversão. Fato esse facilmente comprovado na maioria dos evangélicos, pela ausência dos frutos, que só podem ser gerados pelos que são galhos da videira. (João 15:4-5)

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Fonte: Vi no Genizah - Publicado em Clamando no Deserto e divulgado, também no PC@maral

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